sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Elsa Salzedas, Diretora de Turma do 8º ano - Vocacional

"Pouco podemos fazer por estes alunos"


-Como podemos caracterizar a turma vocacional do 8º ano?
R: Esta turma é constituída por 29 alunos (demasiados) com várias repetências, facto revelador das enormes dificuldades que estes alunos tiveram em acompanhar minimamente o ensino regular ou simplesmente o alheamento que sempre apresentaram relativamente à vida escolar. Estas características têm íntima relação com o contexto socio-económico-familiar de cada aluno. Muitos destes alunos só conhecem um dos progenitores, normalmente a mãe, muito embora esta figura, a maternal, tenha também ela estado pouco presente no desenvolvimento destes alunos enquanto crianças, normalmente por razões laborais. Ficou assim a faltar uma educação para os valores, ou por incompetência ou por falta de tempo, que se reflete na postura atual destes jovens.
-Como foram os resultados do 1º período?
R: Os resultados foram razoáveis para alguns alunos, mas sofríveis para uma maioria. Apesar do nível de exigência ser claramente reduzido, por comparação com o ensino regular, estes alunos mostram fraquíssimas aptidões cognitivas. O absentismo é, a par da indisciplina, o grande problema desta turma.
-Faça o balanço em termos disciplinares até ao momento.
R: Alguns destes alunos têm vindo a desenvolver progressivamente comportamentos desadequados e reprováveis em contexto escolar, havendo um anormal número de faltas e processos disciplinares por comparação com o ensino regular. A situação tem vindo a agravar-se dada a cumplicidade e a conflitualidade entre os alunos. Os problemas disciplinares mais frequentes são a conversa em sala de aula, que ocorre constantemente, pois como o aluno não gosta de aprender, também não sabe ouvir; outros alunos emitem guinchos durante as aulas; alguns, enquanto se balançam nas cadeiras, conversam e riem em voz alta com os colegas que até podem estar no canto oposto da sala de aula, como se estivessem no intervalo. Outras participações disciplinares prendem-se com atitudes graves de desrespeito para com os adultos e até para com os colegas e ainda com situações de vandalismo do material escolar. Estas são as queixas mais frequentes, escritas nas várias participações disciplinares, que mostram claramente que estes alunos nunca quiseram aprender a estar numa sala de aula, não reconhecem as regras e não acatam aquilo que os professores lhes querem transmitir.
-Que medidas preventivas podem ser tomadas?
-R: Como um grande número destes alunos não tem interesse no sucesso escolar e está na escola contrariado, as medidas que poderiam ser tomadas são escassas. Temos tentado envolver a família, mas como aquela nunca foi competente para o processo educativo, os problemas avolumam-se. Este tipo de curso deveria ter técnicos competentes para acompanhar e trabalhar socialmente estes alunos. Só assim se poderia fazer um verdadeiro trabalho de integração social, recuperando muitos destes meninos e meninas de uma eventual marginalidade. Tal como o curso está desenhado, o corpo docente e a escola nada podem fazer, pois temos poucos meios para atuar.
-As aprendizagens propostas a estes alunos são úteis, eficazes e adequadas?
R: A filosofia inerente à conceção deste curso é boa, mas na prática não funciona porque não há meios. Os alunos queixam-se que o curso é demasiado teórico, que passam imenso tempo sentados na sala e que têm enorme carga horária. Eu revejo-me também nestas críticas. Para alunos com estas características, o curso deveria ser mais aligeirado, ou seja com maior componente prática e menor carga horária. Este curso está estruturado apenas para as estatísticas. Lamento que não sejam dados à escola meios para trabalhar seriamente com este tipo de alunos. Pela curtíssima mas já intensa experiência que tenho em cursos vocacionais, discordo em absoluto da constituição de turmas com estas características. As aprendizagens fazem-se muito por imitação de atitudes, comportamentos, linguagem e, quando se olha à volta e nada de bom existe, o processo torna-se complicado. Eu tenho recebido desabafos de pais e alunos da turma e partilhamos o mesmo descontentamento.


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