José Manuel Romana, ex-professor da ESAAG, atualmente aposentado, escreve sobre a participação dos jovens do Liceu na oposição ao regime de antes do 25 de abril.
25 de abril na Guarda
As revoluções, quando surgem, são sempre
resultado de uma “fermentação” de ideias e de atos, ocorrida ao longo de um
certo tempo. Não há geração espontânea, nem na ciência nem nos movimentos
abruptos de natureza político-social.
O 25 de Abril existiu porque, antes,
durante a ditadura do Estado Novo, houve quem lhe resistisse de formas
variadas. A participação dos jovens, a vários níveis, foi importante e, nalguns
casos, decisiva. Recordemos as lutas dos estudantes universitários em
diferentes momentos e as dos estudantes católicos progressistas, membros da JUC
e da JEC. Foram pequenos ou grandes contributos (não sei ajuizar) para o
derrube de um regime político autoritário e repressivo de má memória.
Aqui, na Guarda, em 1969, nas eleições para
a Assembleia Nacional (era este o nome do atual Parlamento) muitos jovens do
antigo Liceu Afonso de Albuquerque participaram, à sua maneira, na campanha
eleitoral da oposição. Eram, então, alunos do 6º. e 7ºanos. Alguns “grandinhos
e de barba” e algumas jovens casadoiras. Distribuíram propaganda, escreviam e policopiavam
os comunicados a “stencil” e demais material até provocarem queixas do
Governador Civil, Dr. Mário, dirigidas à Oposição e endereçadas ao grande nome
e personalidade política da Guarda, Dr. João Gomes. Também recordá-lo é salutar
para a vivência de Abril, nesta Comemoração dos 40 anos.
Tenho comigo esses documentos de troca de
“mimos”. Vou tentar resumi-los, transcrevendo partes. Do Governador Civil: “ A
participação de jovens não eleitores em atividades relacionadas com ato
eleitoral que amanhã se realiza tem sido encarada com o mais largo espírito de
tolerância por parte das autoridades, como é do conhecimento de V. Exª.
Entendeu-se, com efeito, que poderia aceitar-se a sua colaboração como
executantes de simples tarefas materiais, nomeadamente na distribuição de
material de propaganda autorizada, logo que não houvesse perturbação da ordem
pública, como felizmente sempre aconteceu. Já o problema da distribuição das
listas reveste aspetos diferentes e cria problemas que urge disciplinar. (…)
Tendo em conta aquelas fundadas suspeitas e este risco - que só aos pais
compete julgar- venho solicitar a V. Ex.ª. que se digne habilitar todos os
menores…com uma credencial assinada…e ainda com autorização escrita do poder
paternal, documentos que terão de exibir com B.I., sempre que lhe sejam
solicitadas pelas autoridades policiais. Nesta sentido são dadas instruções às
mesmas autoridades (…)”
A resposta do Dr: João Gomes foi incisiva e
rápida: “ A participação dos jovens, não eleitores, e até de quaisquer outros,
não foi procurada nem solicitada, nem pelos candidatos Democráticos, nem pela
Comissão Eleitoral que os apoia, antes sim tem constituído uma adesão livre,
espontânea e da iniciativa absoluta deles próprios. (…) E quero crer que
algumas dessas queixas, não devem ser justas, até porque os Autores delas,
talvez possam incluir-se entre aquelas pessoas que não têm tido educação
suficiente para receber com o devido respeito as listas que lhe são
apresentadas, e que em bom civismo, deviam ser recolhidas, para que pudessem
consciente e livremente exercer o seu direito de voto. (…) Pois, efetivamente,
enquanto as listas da União Nacional têm sido distribuídas principalmente por
empregados administrativos, as listas dos Candidatos Democráticos têm de ser
entregues por estes nossos amigos, e sempre voluntários, que se desejam
entregar a uma atividade que, por si, tem de considerar-se de atividade em
benefício de todo o público e de toda a coletividade. (…)”.
José Manuel Trigo Mota da Romana
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