O AUTO DA BARCA DO INFERNO VERSÃO 2.0
CENA 2 – A DONDOCA DO JET SET
(pelos alunos do 9º E)
Vem
uma Dondoca do Jet Set com o seu vestido Chanel, mala Gucci e botas Louis
Vuitton, bem penteada e toda emproada. No seu telemóvel topo de gama, toca a
canção Burguesinha, de Seu Jorge. Enquanto retoca a maquilhagem, chega ao batel
infernal e diz:
Dondoca
do Jet Set – Mas que sítio é este?
Diabo
–
Ora quem é ela! Estava a ver que nunca mais! Entre nesta Barca, cara jovem bela
e delicada. Surpreendida por estar aqui?
Dondoca
do Jet Set – Surpreendida por ter morrido tão
jovem, mas se esta Barca for a que me leva para o Céu, não surpreendida por
estar aqui.
Parvo
– Quem te dera!
Diabo
– Esta Barca? Para o Céu? Hi hi hi hi hi hi hi! Mas, afinal, estavas à espera
de outro destino, que não este?
Dondoca
do Jet Set – Então é mesmo esta a Barca que vai
para o Céu? Consegui finalmente livrar-me dos males da vida na Terra?
Parvo
– A Terra é que se livrou dos teus males!
Dondoca
do Jet Set – Mas que confusão…
Diabo
– Esta é a Barca que sempre te esperou! A Barca do Inferno!
Dondoca
do Jet Set – Eu, que sempre segui uma vida junto a
Deus, iria agora para a Barca do inimigo? No way! Recuso-me a tal coisa!
Parvo
– Coitadinha! Se já estás habituada a essa companhia, para quê tanto alarido?
Dondoca
do Jet Set – Alarido? Não vejo onde. Se eu digo
que não vou nesta Barca, é porque não vou!
Diabo
– Se em Terra pensavas ser alguém, digo-te que aqui não és ninguém. Vamos, lindinha,
convido-te a entrares nesta Barca, se queres que a tua vida continue igual.
Dondoca
do Jet Set – Já vi que aqui a sorte não está a meu
favor. Vou, então, em busca da minha justiça ao outro lado.
A
Dondoca do Jet Set dirige-se à Barca do Anjo, e diz:
Dondoca
do Jet Set – Ó da Barca! Estais de partida? Gosto
desta Barca, é muito mais requintada do que a outra com que me deparei.
Anjo
–
Olha quem vem lá! A família está bem? E o filho como vai?
Dondoca
do Jet Set – Acredito que estejam a sofrer
bastante com a minha partida. Mas que não chorem muito, que isso faz mal à pele.
Mas… filho? Não sei a que se refere!!!...
Parvo
– Ganda mentirosa!!! Nem no julgamento final dizes a verdade?
Anjo
– Querias ter uma vida plena, enquanto o teu filho lutava pela vida!
Dondoca
do Jet Set – Se tivesse mantido o bebé, teria
destruído a minha vida: o que é que as pessoas iriam dizer por ter um filho
mongoloide? Acha que me iam continuar a tratar da mesma forma?
Parvo
– Ah! Então sempre tens filho! Há pouco tiveste uma branca, foi?
Dondoca
do Jet Set – Já foi difícil manter a forma física
sem que ninguém se apercebesse de que tinha tido um bebé. Já quase tinha
estragado a minha beleza, ainda havia de estragar a minha vida também? Ficando
em casa a tratar de um freek? De um anormaleco? Isso não era nada cool!!!...
Parvo
–
Ah! Ah! Ah! Forma física!!!... (às gargalhadas descontroladas, bate com a
mãos na barriga, os olhos com lágrimas de tanto rir) Pois sempre foi isso
que te importou, não foi? Olha lá: alguma vez ias olhar para esta minha “barriguinha
de cerveja”?
Anjo
– (com ar verdadeiramente zangado) Cuidado com a forma como falas do teu
filho!!! Não sabes que Cristo disse que tudo o que fizesses a uma criancinha o
farias a ele também? Abandonaste um bebé, sabendo que iria ficar em perigo.
Deixaste-o abandonado num ecoponto!!!… Que frieza! Que crueldade! E atreves-te
a querer ir para o Céu???!!!
Dondoca
do Jet Set – Pensava que ninguém o encontraria!
Foi por isso que o deixei no ecoponto amarelo, escondido, em vez de o deixar no
lixo, onde qualquer um abriria a tampa e o poderia ver! (a contragosto) Mas pronto, ainda bem
que alguém o encontrou! E que nunca se soube que era meu!!!
Anjo
– Podes ter a certeza de que esta Barca o encontrou!
Parvo
– Soubemos nós, não é?!
Dondoca
do Jet Set – Cale-se, seu parvalhão! (o Parvo
faz um esgar desconcertado, mas divertido. A Dondoca do Jet Set dirige-se ao
Anjo, com ar sedutor) Mas, meu Anjinho lindo, bom e misericordioso: eu
pensava, quando fosse mais velha, ir procurar o meu filho e trazê-lo para minha
casa. Não tenho culpa de ter morrido tão jovem!
Parvo
– Pois, aqui a Beldade quis comprar um Maserati GranTurismo, foi à velocidade
máxima e espetou-se a 300Km/h. É claro que a Bela não tem culpa de ter morrido
tão nova!!! (risos)
Anjo
– Protegeste a tua imagem no mundo, mas não a conseguiste proteger aqui. Sai
daqui! Vai ao encontro daquele que é dissimulado e enganador e que dá valor a
essa tua imagem.
Parvo
– (com ironia na voz) Sim, sim; fazem o paaarzinho perfeito!
Dondoca
do Jet Set – Mas então, as missas, as idas a
Fátima, as esmolas que dava (milhares de euros, diga-se), não serviram para
nada?
Anjo
– Serviram, sim. Serviram para te condenar ainda mais! Então ias à missa e, em
vez de ajudares as criancinhas, abandonaste a tua?
Dondoca
do Jet Set – Ó triste, o que é que eu fui fazer?
Toda a minha vida pensei que tinha feito a escolha certa, mas parece que estava
enganada. É melhor ir para onde pertenço antes de sofrer mais humilhações e
antes que a Barca encha! Talvez, assim, ainda possa fazer a viagem em 1ª
Classe!!!...
Torna a Dondoca do Jet Set à Barca do
Inferno:
Diabo
– Seja bem aparecida!
Dondoca
do Jet Set –Deixemo-nos de rodeios. Já estou a
sofrer o suficiente, deixe-me só entrar na Barca. Ainda tenho lugar na 1º
Classe?
Parvo
– (com ironia na voz) Não se esqueça de pedir champanhe, minha beldade
linda… e parvalhona!
Diabo
– Faça favor, quer antes o camarote? Vai ser uma viagem muito divertida! Ah! E
toca a tirar esse casaquinho Chanel: ponha-o nesse cabide, que lhe tolda os
braços para remar.
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