Henrique O'Neill |
Henrique O’Neill, visconde de Santa
Mónica e preceptor dos príncipes D. Carlos e D. Afonso, filhos de D. Luís I, publicou
em 1885 um monumental volume de mais de 700 páginas com 316 fábulas, dedicado
ao príncipe D. Carlos. As histórias, destinadas “à educação dos filhos do Povo
Português” revelam bem a sociedade de oitocentos com os seus hábitos, modos de
vida, atitudes e valores.
São fábulas em verso, baseadas
algumas nas correspondentes de Esopo e Fedro, outras com base em episódios
conhecidos do autor, como “O chaparral”, “Os nabos e os grelos” ou “O urso”. O
ponto de vista é quase sempre o de um homem de letras, que vive no ambiente do
Paço mas os “poderosos e mesquinhos” não escapam à sua língua afiada. É quase
sempre um verso de 8 sílabas, em poemas longos mas ágeis e bem compostos. É um prazer ler estas fábulas, em livro disponível na BE Vergílio Ferreira.
Eis uma das fábulas:
A MANTEIGA E A MARGARINA
Com voz untuosa e meiga
Disse um dia à margarina
A manteiga:
-“Olhe, menina,
Uma coisa é nascer pura,
Filha de leite de vaca;
Outra é ser ruim gordura,
Uma imitação velhaca.
Se você de boa fé
À venda se apresentasse
De carinha descoberta,
Sem a esperta
Se meter
E a fingir o que não é;
Nada tinha que dizer
Quem no mercado a comprasse,
E eu não lhe pedia meças:
Mas você, por fim, com essas
Velhacarias nojentas,
Feita capa de ladrões,
Vai levando pelas ventas
E passa por vergonhões”.
Pretensão
É menos justa
Qu’rer subir à alheia custa:
E, se alguém isso tentar,
Pode achar
Quem, e com muita razão,
Lhe dê severa lição,
Pior que a manteiga fina
Pespegou à margarina.
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