É um dos mais célebres poemas de Natal da língua portuguesa. O facto de ser datado transporta-nos por exemplo ao inferno do Vietname de 1967. Mas os infernos de hoje são iguais, alguns dentro de portas.
"Ele" no entanto vai nascer esta noite à meia-noite em ponto! E anda por aí, a "pedir-nos contas do nosso tempo".
LITANIA PARA O NATAL DE 1967
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
num sótão
num porão numa cave inundada
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
dentro de um
foguetão reduzido a sucata
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
numa casa de
Hanói ontem bombardeada
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
num presépio
de lama e de sangue e de cisco
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
para ter amanhã a suspeita
que existe
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
tem no ano
dois mil a idade de Cristo
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
vê-lo-emos
depois de chicote no templo
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
e anda já um
terror no látego do vento
Vai nascer
esta noite à meia-noite em ponto
para nos pedir contas do nosso tempo
David Mourão-Ferreira
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