terça-feira, 22 de agosto de 2017

OFICINA DE ESCRITA 2016/17 (10) Mais narradores impensáveis

10º A
      Textos resultantes da Oficina de Escrita dinamizada por Luís Chaves e promovida pela BMEL em colaboração com a Bibl. Escolar Vergílio Ferreira em março-maio 2017 na ESAAG




Textos com narradores impensáveis
Ali estava eu, no fundo da prateleira, a sentir cada vez menos peso sobre mim. Primeiro uma, depois outra e depois outra… Já eu estava cheia de pó, quando finalmente fiquei à vista porque as outras tinham sido levadas.
Queria ser levada por uma pessoa muito especial que tivesse momentos fantásticos a recordar, histórias para contar à vista de qualquer um.
Estava eu a dormitar quando, por instantes, sinto um toque e ouço uma voz, dizendo: “É a ideal, finalmente encontrei o que procurava. São umas simples tábuas de madeira grandiosa, sem nenhum tipo de beleza acrescentada à original, o que for lá colocado é o que a tornará mais bela”.
Fiquei tão feliz, já estava cansada daquela prateleira funda e sombria, não ia deixar-me saudades.
Ao fim de uma breve viagem, cheguei à sala de estar de uma casa cheia de luz, de alegria e de cheiros dos mais variados. Fui pendurada bem no centro da parede, e que bem que eu fiquei, com o retrato daquela família feliz.
Jéssica Vendeiro

Estava numa papelaria, onde tudo era muito calmo e tranquilo. Era o último dia de verão, o que significava que era o dia perfeito para as pessoas comprarem material escolar. Nesse dia, estava muito desconfiado de que alguém iria escolher-me porque já estava há dois meses naquela papelaria e ainda a sorte não me tinha aparecido. Até que, a hora chegou, uma rapariga loira e de olhos azuis chegou à prateleira e comprou-me.
Depois disto, fiquei muito feliz e senti-me livre, pois já estava farto de ficar naquela prateleira horrenda e suja.
Ela levou-me para uma casa de campo, onde tinha uma vista incrível. O seu quarto estava todo arrumado e, depois de ter chegado, ela pôs-me dentro do estojo. Fiquei lá toda a noite, por outras palavras, fiquei no meu novo quarto.
Depois, comecei a ir à escola, onde principiei a ajudar a rapariga a escrever textos, a fazer exercícios, entre outras coisas. E foi sempre assim o percurso da minha vida. Ia morrendo aos poucos, quando era aguçado pela afia, e quando já estava demasiado pequeno, a rapariga atirou-me para a floresta.
Sou um simples lápis.
Jordi Marcos


A minha vida é algo rotineiro, vou todos os dias com ela. Não sei como, mas nunca se esquece de mim. Todas as manhãs, põe-me no pulso e vou com ela para mais um dia, para mais uma aventura.
Chegamos à escola e começa o corrupio. Cumprimenta os amigos e vamos para as aulas. Geralmente os momentos em que recebo mais atenção são quando está a ter uma aula aborrecida ou quando está tão ansiosa para que algo aconteça que o tempo parece nem passar.
Por vezes, troca-me pelo telemóvel, quando quer que o tempo passe mais rápido ou precisa de maior exatidão. Mesmo que nem sempre receba a atenção que quero, é bom ir com ela, conheço locais novos, pessoas novas, histórias novas, coisas que nunca tinha conhecido enquanto estava naquela vitrine, onde as pessoas só sabiam julgar-me pelo aspeto.
Acompanho-a nos bons e nos maus momentos, sinto a pulsação todo o dia, sinto-me útil quando estou com ela, guio-a, mostro-lhe como o tempo passa rápido, na tentativa de que ela não o desperdice.
Quando chegamos a casa, ela pousa-me na cómoda do quarto, nem sempre é confortável ter-me no pulso, sempre a pressionar, às vezes, é bom perder a perceção do tempo. Desde o momento em que ela me pousa na cómoda, até à manhã seguinte, eu espero. Durante a noite, imagino o que ela estará a sonhar, imagino se entro em algum dos sonhos. Talvez entre, talvez seja por isso que ela se lembra de mim todas as manhãs, sem exceção, porque entrei no sonho dela.
Mesmo que haja algum dia em que ela se esqueça de levar-me, a marca que lhe fiz no pulso, por não apanhar sol, vai com ela para onde quer que vá. Por enquanto, ela ainda me leva e isso faz de mim muito mais do que um simples relógio de pulso.
Juliana Amaral

Estava eu no mar juntamente com os golfinhos, os leões marinhos, as tartarugas marinhas e peixes de várias espécies a viver um dia normal, como os outros. Naquele oceano éramos livres, mas, ao mesmo tempo, viver ali era um bocadinho aborrecido. Sempre via os mesmos companheiros, sentia que devia conhecer alguém mais alegre e divertido.
Certo dia, avistámos uma coisa enorme, a flutuar e colorida, com monstros lá dentro; de repente, fiquei confusa, pois nunca tinha visto este tipo de coisas por aqui.
Comecei a ver um leão marinho coberto de redes e aflito e, quando me preparava para fugir, senti algo à minha volta, então percebi que estava cercada por redes. Um monstro estranho agarrou-me e meteu-me dentro de uma piscina pequena. Estava assustada, mas junto dos meus amigos.
Mais tarde, apareceu um monstro e transportou-nos para um lugar extraordinário. Havia animais de todas as espécies. Num aquário, juntaram-me às minhas companheiras, que me acolheram todas bem, eram muito simpáticas. 
Duas horas depois, apareceram no aquário aqueles monstros estranhos que já tínhamos visto. Andavam com dois pés e tinham dois braços, aqui ainda fiquei mais confusa e com mais medo. Passados 30 minutos, estava cheio daqueles monstros, que ainda não sabia bem como se chamavam, mas as minhas companheiras alertaram-me de que eram monstros simpáticos e divertidos e que nos vinham ver todos os dias.
No dia seguinte, chegou outro monstro, bastante simpático, dava-me comida sem eu ter que fazer esforços e também me treinou para que pudesse atuar em frente de monstros pequeninos. Senti que aquilo era a minha nova vida, alegre e divertida, afinal, tratavam-me bem e eu fazia os outros rir.
Ali é que eu estava bem e fiquei lá para sempre.
Sou uma verdadeira foca.
Rita Marcos


Era só mais um dia naquele rotineiro clic...clac...clic...clac... não o som de um qualquer, mas sim o da sala G28.
Quando eram oito e meia, já a horrível “stora” de ciências naturais encontrava-se presente na sala a distribuir as quatro versões do teste. De repente, a miúda cá da frente entra, senta-se e faz cara de santa, mas todas as coleguinhas sabem que por debaixo daquele ar de anjo está o diabo que ela realmente é. Com os óculos, que mais parecem o fundo de uma garrafa, aprumou-se para começar a fazer o teste, quase de certeza iria tirar 100 por cento.
Já só faltavam 5 minutos para a saída quando toda a gente olhava para mim com sete pedras na mão. Eu bem via como toda a turma estava desesperada. Pudera, com aquela professora ninguém iria tirar mais de 50 por cento, a não ser aquela rapariga que todos os dias se sentava lá à frente. Após o último aluno ter entregado o teste, eu fiquei sozinho, quer dizer, eu e o projetor que não funcionava desde o 3º período.
Às dez e um quarto já toda a gente se reunia na sala, menos a “stora” (acontecimento normal porque ela chega sempre atrasada) ... Como era uma aula de história, todos os alunos adormeceram, tal como me dava jeito, já que as minhas pilhas deixaram de dar e eu caí no vazio. Sim, sou um relógio.
Rodrigo Santos

Um dia diferente
Depois de muitos dias, sempre com a mesma rotina, houve um em que tudo foi diferente. De manhã, quando acordei, estava tudo muito escuro, não conseguia ver nada, apenas sentia a respiração de outros como eu. De repente, começou a ver-se luz, senti uma mão a puxar-me para fora e a colocar-me no pulso, junto de muitas outras idênticas a mim.
Mal começou o dia, e já me tinha apercebido de que não estava em casa, ouvia o som dos carros e das pessoas, e mal conseguia equilibrar-me, pois estava sempre a bater e a passar por cima das minhas companheiras.
Durante a manhã, enquanto estava na aula da minha proprietária, não conseguia parar de ouvir o chato e aborrecido relógio do outro pulso sempre com o seu tiquetaque. Na hora de almoço, adormeci e só voltei a acordar no final da tarde, quando já estava a chegar a casa.
Tinha sido um dia muito cansativo para mim, pois nunca tinha tido assim um, com tantas correrias e confusões. Fiquei muito contente, no final do dia, quando voltei para junto da minha família, a minha caixinha junto das outras pulseiras.
Sara Marques

Ainda me lembro dos dias na loja de música. Entravam dezenas de pessoas de todas as idades à procura de um novo instrumento, brilhante e pronto para ser tocado. Todos os instrumentos estavam devidamente arrumados, uns no chão, outros em prateleiras enormes pregadas às várias paredes. A minha prateleira estava quase cheia. Já praticamente ninguém se interessa por violinos ou simplesmente não gosta. E os que têm interesse são crianças que apenas querem mostrar que tocam ou estragar os instrumentos. Raras são as pessoas verdadeiramente movidas pelo gosto e pelo interesse de tocar violino.
Um dia, estava eu na prateleira a ver as horas a passar, quando entrou um rapaz que me captou a atenção. O olhar encantado a olhar para nós não deixava esconder a paixão pela música. Olhou a prateleira até que o seu olhar parou em mim. De repente, caminhou na minha direção, pegou-me e começou a tocar uma bela melodia. Melodia essa que a pouco a pouco foi enchendo a loja, o bairro, a avenida e, sem nos apercebemos, a cidade inteira. Quem diria que após tantos meses naquela loja apareceria alguém que me quisesse tocar!?
Rapidamente as pessoas de todo o país começaram a gostar da nossa música, a querer ouvir-nos, dia após dia. E aqui estou, a dez minutos do meu primeiro concerto, com uma orquestra famosa e com o coliseu cheio, cheio de pessoas a querer ouvir-me.

Maria Sousa Fidalgo
(Frases criativas / colagens de Mariana Almeida e Francisco Gonçalves, por esta ordem)

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